Em entrevista ao Alt Tabet, do Canal UOL, o ator Antônio Fagundes revelou que uma cláusula em seu contrato de 44 anos com a Globo o fez desistir de renovar com a emissora carioca. O veterano explicou que só continuaria no canal se tivesse liberdade para escolher os dias em que gravaria as cenas, de forma que isso não atrapalhasse suas peças de teatro.
Na sabatina, Fagundes contou que, quando assinou o contrato com a Globo, impôs a condição de gravar apenas de segunda a quarta-feira. Dessa forma, ele poderia se dedicar ao teatro nos outros dias.
“Talvez eu continuasse lá se a proposta que eles me tivessem feito não fosse oposta ao que quero para minha vida. Quando entrei na Globo, já fazia teatro, e a primeira condição que pedi para ser respeitada, para que eu trabalhasse lá, foi a de que eu só gravasse na folga do teatro”, disse o artista.
“Eu tive, durante 44 anos, um acordo com eles de que só gravaria de segunda a quarta, porque de quinta a domingo eu fazia teatro. Mas, quando a proposta de renovação não incluía essa cláusula, percebi que não seria bom para mim, pois o teatro é a minha prioridade.”
Antônio Fagundes também disse que enxerga com naturalidade a decisão da emissora de encerrar contratos longos, mesmo com nomes consagrados da TV. “As coisas têm um movimento natural. A Globo, como empresa, seguiu o seu caminho, buscando novas formas de comercializar seus produtos”, finalizou.
Como é o novo contrato da Globo?
Nos últimos anos, a Rede Globo tem encerrado os contratos fixos de vários artistas veteranos, como Antônio Fagundes, Stênio Garcia, Marieta Severo, Osmar Prado, entre outros. O objetivo da empresa agora é cortar os altos salários e firmar contratos por obra, o que acaba deixando os atores livres para negociar trabalhos com outras emissoras ou plataformas de streaming.
Contrato vitalício e salário alto
Em maio do ano passado, o colunista Alessandro Lo-Bianco, do programa ‘A Tarde é Sua’, informou que a TV Globo resolveu reduzir o salário da atriz Susana Vieira. A justificativa da emissora seria uma suposta redução de custos.
Ainda segundo Lo-Bianco, a Globo estaria tentando negociar com alguns contratados para mantê-los no elenco fixo. O reajuste de Susana reduziria seu salário em R$ 220 mil, passando a receber R$ 30 mil por mês, e não os R$ 250 mil anteriores.
O único adendo do contrato da atriz é que ela receberia um acréscimo no salário sempre que tivesse um projeto sendo transmitido pela emissora.
De acordo com o portal F5, do jornal Folha de S. Paulo, Susana Vieira renovou com a Globo até 2027. Nos bastidores, circulam boatos de que o contrato da veterana é considerado vitalício.
Veteranos com contrato vitalício e regalias
Nomes como Fernanda Montenegro, Susana Vieira, Carlos, Laura Cardoso, Léo Batista, Rosamaria Murtinho e Mauro Mendonça Vereza são tratados de forma diferenciada devido ao reconhecimento da emissora de Roberto Marinho, por terem ajudado a construir a história da televisão brasileira e protagonizado grandes trabalhos na Globo.
Essas regalias incluem um bom salário, contrato renovado automaticamente, plano de saúde e trabalhos esporádicos na TV.
Análise de especialista em gestão estratégica de imagem
O jornalista Higor Gonçalves, especializado em gestão estratégica de imagem, fez uma análise sobre o assunto e explicou a nova reformulação da emissora. Leia abaixo na íntegra!
“A imagem da Globo, ou seja, a forma como a emissora é vista pelo público, sofreu diversas transformações ao longo do tempo. Desde a sua fundação, em 1965, até a consolidação como rede nacional de televisão, dez anos depois, passando pela expansão das operações e pela chegada à liderança de audiência, a empresa conquistou uma reputação valiosa. Uma imagem construída a partir de decisões empresariais assertivas, inovações tecnológicas, produtivas e comerciais bem implementadas e, não menos importante, de uma gestão de talentos competente.
Todos esses elementos, em paralelo a acordos político-econômicos estratégicos para a empresa e a contingências, como a histórica inundação que atingiu o Rio de Janeiro em 1966 e que foi coberta ao vivo pela Globo, ajudaram a construir a reputação da emissora. Uma imagem ora controversa, é verdade, mas também de prestígio, diga-se de passagem. Quem não se lembra, por exemplo, de expressões como ‘padrão Globo de qualidade’ e ‘toda-poderosa’?
Ocorre que, com a chegada do século 21, e em decorrência das transformações político-econômicas, sociais e tecnológicas dos anos 2000, a emissora começou a sofrer constantes quedas de audiência, mesmo emplacando produtos de sucesso. Na época, o aumento da renda média causou mudanças nos hábitos de consumo da população, que passou a sair de casa com mais frequência e a migrar para outras fontes de informação e entretenimento. No mesmo período, a internet começou a se popularizar e a atrair parte do público das emissoras abertas de televisão.
Um amplo estudo realizado pela Kantar Ibope Media sobre a audiência das TVs abertas brasileiras constatou que, entre 2001 e 2021, a Globo perdeu cerca de 1 em cada 3 telespectadores. A média nas 24 horas do dia em rede nacional, que era de 20,5 pontos em 2001, caiu para 15,3 pontos vinte anos depois. A Globo não foi a única emissora a perder espectadores. Com o crescimento do acesso à internet e a popularização do uso de dispositivos móveis, como celulares e smartphones, uma parcela considerável do público das TVs passou a se inteirar dos acontecimentos e a se entreter de modo online, por meio de portais de notícias, mídias sociais, jogos eletrônicos e serviços de streaming.
As mídias digitais conquistaram uma parte significativa do público. Com a debandada da audiência para outras plataformas, a publicidade também se dispersou. Se antes as TVs disputavam as verbas dos anunciantes apenas com veículos como rádios, jornais e revistas, por exemplo, as alternativas para a exibição de publicidade passaram a ser diversas. Instaurou-se uma ‘guerra pela atenção’. Que, neste momento, está acirradíssima.
A Globo vem sentindo esse efeito há cerca de uma década, mas, há pelo menos cinco anos, percebendo que a conjuntura não iria melhorar, começou a enxugar despesas por meio do projeto ‘Uma Só Globo’. A primeira fase ocorreu entre 2018 e 2021, com o intuito de transformar cinco operações do Grupo Globo, incluindo a própria TV Globo, numa única empresa. A intenção era integrar equipes e estruturas, desenvolver novas áreas de atuação, criar novos negócios, buscar fontes alternativas de receitas e, principalmente, transformar a empresa em uma ‘media-tech’, capaz de entregar conteúdos e serviços por meio de métodos online que combinam mídia e tecnologia digital, como Netflix e Spotify, por exemplo. Acontece que a primeira etapa da reestruturação chegou ao fim, no segundo semestre de 2021, sem muito a comemorar.
Renegociação de contratos, venda de propriedades e desligamentos de colaboradores tornaram-se uma constante na Globo, que está atravessando um intenso processo de digitalização e focando todas as energias no Globoplay. É importante destacar que outros grupos de mídia robustos, no Brasil e no mundo, estão se reestruturando, promovendo cortes e tentando equilibrar despesas e receitas para se manterem competitivos. No entanto, em termos de imagem, ou seja, da percepção pública, o caso da Globo é diferente: parte do público tem rejeitado a emissora, sobretudo nos últimos dez anos, por enxergar um suposto alinhamento político-ideológico com pautas consideradas de esquerda.
Os atritos públicos com o último governo federal, que foi eficiente em propagar a ideia de que a Globo era esquerdista, que conspirava contra o país e que dependia exclusivamente das verbas de patrocínio estatal antes de 2019, também contribuíram para a mudança da percepção. Todos esses fatores, somados às divulgações nos últimos anos de prejuízos financeiros milionários, demissões voluntárias e compulsórias de famosos e anônimos, e, principalmente, de uma gestão de crise de imagem corporativa ineficaz por parte da empresa, transmitem a impressão de falência. É como um império que está desmoronando. Mas o fato é que o Grupo Globo não está falindo. Uma evidência incontestável, segundo levantamento recente divulgado pela revista Forbes, é que a família controladora do conglomerado se mantém entre as mais ricas do país.”
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